?

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

River Phoenix: A Última Entrevista (SET/1993) [Parte 1]


Esta entrevista foi feita no set de filmagem de "Dark Blood", de George Sluizer, em 19 de outubro de 1993, em Utah.  Quando River Phoenix faleceu, pouco menos de duas semanas depois, o filme estava incompleto e, com a sua morte, foi cancelado. Nesta conversa com o correspondente da revista francesa Première em Los Angeles, o ator inicia com a seguinte frase: “Na verdade, eu não gosto de dar entrevistas, a não ser a trabalho”. Apesar disso, falou compulsivamente, e, tropeçando nas ideias, revelou seu lado místico, suas impressões sobre o mundo e seus sentimentos em relação à carreira de ator. Premonitoriamente, ao falar do seu trabalho seguinte, "Entrevista com o Vampiro", Phoenix disse que não o sentia como um filme no qual iria participar.  A seguir, a ultima entrevista do ator, publicada com exclusividade por SET.

* Agradecimento especial a Whether Phoenix, que me enviou a entrevista (que só tenho no meu exemplar da revista) neste formato! Valeu!
 


Por Jean-Paul Chaillet,

PARTE 1

P: O que mais o atraiu em Dark Blood?
 .
RP: Acho que o que mais me envolveu nesse script  foi a história do homem branco trazendo a sua assim chamada, civilização, para uma terra virgem, o processo de adulteração.  O que é o progresso e o que é a quebra de átomos, essa encruzilhada... Foi muito simbólico para a América, sabe, ser a primeira a... você sabe, a explosão nuclear.

P:  Onde foi?

RP:  Em Los Alamos, Novo México, e é uma das coisas mais interessantes... Eu li "American Ground Zero", o livro que justifica isso. Tudo bem. Eles iam esperar que o vento soprasse em direção de Utah, onde estamos agora, iniciando testes nucleares à noite.  É impressionante quando você vai pesquisar isso tudo. George (Sluizer, o diretor) encontrou um monte de questões interessantes. Mas a principal razão que me levou a trabalhar nesse filme foi por que eu senti que era um aspecto importante do debate.

P:  Você ainda é relativamente muito novo, 23 anos... Mas seus filmes A costa do Mosquito, Quebra de Sigilo, O Peso de Um Passado lidam com temas sociais ou políticos e procuram passar uma mensagem. Você se vê como um ator que tem interesses mais profundos?

RP:  Eu não acredito que exista alguma regra a priori. Eu chego aos assuntos através do que vou lendo, e quando sinto que podem dar um bom script, isso me inspira. Escolho pelo que leio. É uma seleção individual.

P:  Alguns atores da sua geração (detesto dizer isso) fizeram filmes apenas de apelo comercial, que renderam boa bilheteria.  Suas escolhas parecem estar bem longe disso.

RP:  Eu acredito que muitos dos filmes poderiam ter sido um grande sucesso... se eu não estivesse neles. E eu arruinei aqueles que poderiam ter feito uma boa carreira.



 
P:  Eu quero dizer que eles fizeram filmes de apelo adolescente ou algo nessa linha.

RP:  Bem, eu fiz um filme chamado A Thing Galled Love (“Um Sonho, Dois Amores”, dirigido por Peter Bogdanovich). O filme era para ser um grande estouro, aquela visão caipira orgulhosa, aquele country genuinamente norte-americano; mas por causa da minha influência, do meu trabalho, da reestruturação dos diálogos, das pessoas que eu trouxe para o filme... – a música, o produtor, assim como outros aspectos... Você sabe, Dermot Mulroney e Antony Clark (que interpretam os personagens Kyle Davidson e Billy, respectivamente) mudaram o filme drasticamente. A Paramount não está muito feliz comigo por que a coisa toda seria um sucesso ao invés de um drama intimista. Não é o melhor script de todos, mas eu tinha visto alguma coisa nele e portanto dei duro, procurei torná-lo uma historia com personagens e não algo vago.
 
P:  Sua personagem no filme atual (Dark Blood) é um tipo solitário. Como você o descreveria?

RP:  Como uma pessoa que é minimalista e busca refugio em espaços abertos. Ele tem uma visão limitada do mundo.

P:  Ele é místico? Tem uma visão mística?

RP:  Bem, ele foi apanhado pela cultura nativa norte-americana, pela população indígena, é conseguiu passar por provas, tornando-se um irmão de sangue, em essência, adotando suas crenças, apreendendo o segredo sagrado da fabricação de bonecas, o que é especial, pois não se permite que homens brancos façam Kachinas. É um segredo tribal muito bem guardado, mas que lhe foi revelado por que ele havia passado pelas provas e seus únicos amigos eram os índios ali da terra e –  eu acho  que ele sentia a injustiça na pele, aquilo tudo que as populações nativas haviam passado, toda a exploração e agora esses testes nucleares contra uma população que não tem a menor ideia do que era energia nuclear e muito menos suas consequências. Isso o fez rebelar-se contra  o governo, toda essa injustiça.

P:  Mas tudo isso estava no script ou foi você quem sugeriu e discutiu e...

RP:  Bem, quero dizer, todo esse background que eu te mostrei eu havia escrito e – bem, é algo que você não vê no filme, mas foi de onde parti para melhor descrever. Eu faço a biografia de cada personagem porque acho que é a única maneira para você se ater às referências dos personagens.

P:  Mas você costuma fazer isso com os papeis menores, como em Quebra de Sigilo?

RP:  Claro. Sempre.

P:  Você escreve tudo aquilo que vem com o personagem?

RP: Bem, eu escrevo um monte de coisas. Não esqueço o que penso. Tenho uma memória muito boa. Portanto, em alguns casos basta ficar lembrando e repetindo aquilo na cabeça como se estivesse lembrando-se da infância. Se você escreve muito sobre certos personagens, acaba ficando muito tediosos e impróprio. Em Garotos de Programa eu escrevi muito.

Continua...


Fonte: Revista SET, em novembro de 1993

21 comentários:

  1. Esses dias assisti "um sonho, dois amores" e é realmente é perceptível quão o River era enigmático. Sua interpretação, seu olhar..O filme deixa de ser piegas devido a interpretação dele, James Wright era uma incógnita, não dava para saber ou deduzir o que ele sentia por Miranda Presley..Quanto a Dark Blood, infelizmente ainda não tiver oportunidade de assisti-lo em sua conclusão pelo Sluizer , mas sem dúvida alguma o River deveria ter atuado magistralmente! Á propósito, Femme, não sei se já li no seu blog, mas lembro-me de ter assistido no E!( se não me engano) um documentário sobre o River que uma das razões da fatídica noite na viper room dele ter usado o speed ball seria por causa de desentendimentos, talvez incompatibilidade de gênio ( que não consigo entender alguém não se sentir bem com um ser humano tão doce e iluminado como o River) com uma atriz deste filme. É verdade? E você sabe dizer quem era essa atriz? Abraços! Amo seu blog! River ainda vive em nossas memórias!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. A atriz que ele teve problemas chama-se Judy Davis.....

      Excluir
    2. Oi, Anônimo,

      River sempre transmitiu muito mais do que o que está na superfície, incrível como ele consegue dar profundidade a qualquer personagem que encarna! Desde que o vi em "Conta Comigo" senti isso: ele sabia falar profundamente com o olhar, aliás, seu corpo inteiro se expressava lindamente...<3

      E, infelizmente, é verdade. Judy Davis e George Sluizer (o diretor) se odiavam, e River, como sempre, tentava conciliar os ânimos, buscar a paz, e acabava sobrando pra ele! Segundo vários relatos, o clima no set é tão ruim que afetava a todos, então os produtores eram chamados,mas nada se resolvia. River, muito sensível, devia sentir mais...

      Mas, devo registrar que, na versão de Judy Davis, quem tornava tudo difícil pra River no set era o diretor!..rs..

      Enfim, quem sabe um dia eu publique aqui só as falas dela sobre River? Veremos.

      Beijos.

      Excluir
  2. Concordo com o anônimo, James Wright é realmente uma incógnita..mas não consigo imaginar ninguém nesse papel a não ser River..eu acho que a dureza e a tristeza do James se funde muito com a fase dificil que river vinha passando..por isso sempre que assisto as vezes não sei onde termina um e começa outro..acredito que isso tenha contribuído muito já que river não sabia deixar a alma e a essência dele da porta para fora dos estúdios como muitos fazem. E essas matérias, sempre tao reveladoras! Interessante que algo de " Thing Called love" sempre vem à tona né?!
    É triste ver River tao desgostoso com a indústria de cinema..que sempre ia contra o que ele acreditava
    ..cuja única preocupação era render,era dinheiro..River estava cansado de fazer parte disso..
    Lendo essa ultima entrevista,ela me a remete a entrevista com o John..dizendo que Hollywood estava fazendo ele sangrar..nessa ultima entrevista acho que isso fica bem claro.. E penso que a idéia da produtora na época era avalancar a carreira da Samantha..algo como " Girl Next Door".

    Bjoss Femme! Sempre bom descobrir essas raridades!

    ResponderExcluir
  3. Concordo com o anônimo, James Wright é realmente uma incógnita..mas não consigo imaginar ninguém nesse papel a não ser River..eu acho que a dureza e a tristeza do James se funde muito com a fase dificil que river vinha passando..por isso sempre que assisto as vezes não sei onde termina um e começa outro..acredito que isso tenha contribuído muito já que river não sabia deixar a alma e a essência dele da porta para fora dos estúdios como muitos fazem. E essas matérias, sempre tao reveladoras! Interessante que algo de " Thing Called love" sempre vem à tona né?!
    É triste ver River tao desgostoso com a indústria de cinema..que sempre ia contra o que ele acreditava
    ..cuja única preocupação era render,era dinheiro..River estava cansado de fazer parte disso..
    Lendo essa ultima entrevista,ela me a remete a entrevista com o John..dizendo que Hollywood estava fazendo ele sangrar..nessa ultima entrevista acho que isso fica bem claro.. E penso que a idéia da produtora na época era avalancar a carreira da Samantha..algo como " Girl Next Door".

    Bjoss Femme! Sempre bom descobrir essas raridades!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi, Alessandra!

      É curioso como este personagem não se revela por inteiro pra ninguém, né? Nem mesmo pra nós, que o assistimos de fora! rs

      Às vezes, eu penso que uma parte de River que era profundamente triste se expressava nestes personagens, transbordava pelos olhos, saía pelos poros! Depois, ele retomava a alegria de viver, reencontrava os amigos/família a quem amava, buscava outras formas de expressão artística (a música, por ex) e a parte dele que era feliz renascia.

      Naquele artigo escrito pelo diretor Peter Bogdanovich, ele diz enfaticamente que River era muito diferente do James, que era iluminado, solar, enquanto James é sombrio, que parecia realmente outra pessoa quando, finalmente, o reencontrou fora do personagem, lembra? Que só conheceu o verdadeiro River meses depois do filme estar realizado, e que foi surpreendente.

      Também já li repórteres dizendo que River, ao vivo, era muito mais leve que seus personagens, e muito mais bonito ainda! UAU!! Como pode isso?!...rs..

      River parecia mesmo ter desacreditado da indústria do cinema, tendo em vista que nada mais era, para eles, que fonte de lucro. Seu talento, seus esforços pela arte, nada significavam se não rendessem bons lucros.

      Sobre a Samantha, segundo o diretor esta virada da produtora para destacá-la neste filme só veio depois do filme terminado, quando viram que saiu tão comercial como eles queriam. Então, editaram o filme todo, cortaram muitas partes de River, e surpreendentemente, deram destaque a ela (não a River) na capa do DVD. Enfim, desfizeram todo o esforço deles....

      Alessandra, vc leu "River Relembrado por Peter Bogdanovich", que postei aqui em 4 partes, em 2013)?! Acho um dos maiores e mais fantásticos materiais para entender o River!! Se não leu, leia. É imperdível!

      Beijos!!

      Excluir
  4. River River, esse cara é um mistério.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Um mistério que nós adoramos tentar decifrar...rs...

      Excluir
  5. Ótima postagem femme, como sempre. Ansiosa pela continuação.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi, Anônimo

      Estou preparando a continuação ..rs.. e já pesquisando novos materiais! ;)

      Beijos.

      Excluir
  6. Oi Femme

    Que bom que vc voltou. Adorei reler essa matéria. Na verdade eu já tinha lido, já que sou fã dele há mais de 20 anos rs.

    James Wright é o personagem dele que mais gosto. Acho que é porque é o mais maduro, mais macho alfa rs, além de ter esse lado sombrio e, claro, por explorar o lado musical do River.

    Mas também gostei muito do Boy, o primeiro vilão que o River fez, mesmo a gente torcendo por esse vilão tão adorável.

    Acho incrível quando o River diz que o The Thing Called Love teria sido um sucesso comercial sem ele. Bem, não acredito nisso. Mas o interessante é que, como vc disse, o River nunca era superficial em nada.

    Você já viu o documentário My Own Private River, do James Franco, que está no youtube? Tem cenas inéditas do MOPI e o mais incrível é como ele realmente fazia cenas iguais de modos totalmente diferentes. E como ele realmente entrava no personagem. Em alguns momentos desse documentário eu realmente fico na dúvida se o River estava representando, ou se era ele mesmo na cena.

    bjos

    Safiri

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi, Safiri!

      O personagem dele que eu mais gosto é, definitivamente, o Chris Chambers. Não tem jeito, eu simplesmente AMO aquele garoto, que me apresentou ao River da forma mais adorável! Acho que amo o Chris tanto quanto amo o River! ..rs..Mas acho o trabalho de criação do James primoroso, mais um que demonstra o seu enorme talento.

      Sobre o documentário, eu vi algumas partes (inclusive trouxe para o blog), mas não sabia que ele estava inteiro no youtube! Jura?! UAU! Vou pesquisar e assistir mil vezes, com certeza!!

      Mas nestes poucos trechos dá pra ver o quanto utdo que River fazia virava "ouro", como disse James Franco. O que seria material descartável, com ele se torna Arte!

      Sei que ele "vivia' o personagem durante todo o processo de filmagem (a ponto de Peter Bogdanovich ter dito que só o conheceu "de verdade" meses após a gravação do filme). E essa verdade se materializava naqueles personagens mais reias que muita gente que a gente conhece mesmo. River era mágico, um gênio na sua arte, sem exagero nenhum.

      Beijos!

      Excluir
  7. Femme me tira uma dúvida. A Samantha teve outro namorado depois do River? Pq eu pesquisei e não encontrei nada que dissesse que ela voltou a namorar depois do que aconteceu com o River.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi, Anônimo

      Olha, eu imagino que ela deve ter tido outros relacionamentos, até porque era muito jovem quando River morreu, mas nunca ouvi falar que tenha casado, o que é muito raro em Hollywood, né? Mas tem fotos dela acompanhada em alguns eventos depois daquele dia.

      Excluir
  8. Oii Femmeeeeee.....você por aqui???? Rsrs Estou adorando essa matéria!! River maravilhoso... :) :) Saudades!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oiii, Leah!

      Pois é , eu ainda por aqui, viva e ainda amando este artista maravilhoso! ..rs..

      E fico feliz que vc também esteja ainda por aqui!...kkkk...

      Beijos, querida!!

      Excluir
  9. Ri muito com "Macho Alfa" Safiri....super concordo com você! Rs

    ResponderExcluir
  10. É impressionante ler cada comentário e perceber q sentimos a mesma coisa por ele: algo avassalador e inexplicável.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Sim, algo que não tem nome nem fim. River forever! <3

      Excluir
  11. Nossa, li sim! São incríveis! De todas as matérias é a que eu mais gosto! Revi várias vezes o filme e cada vez que assisto gosto mais, a gente vai descobrindo uma riqueza infinita de detalhes. Tinha uma versão sem cortes no Youtube, mas infelizmente tiraram por direitos autorais. Femme vc já viu no Youtube um documentário sobre o filme, em que uma das figurinistas fala das roupas do elenco? Quando ela mostra aquela japona ou casaco xadrez que o River usou,ela começa a falar e voz dela começa embargar...ela guardou todas as peças que eles usaram..

    Bjos!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Pois é, River se esforçou tanto, trabalhou tanto e a edição reformou o filme todo! Poxa, imagino como ele deve ter ficado frustrado com isso...até suas falas tiveram que ser refeitas.

      E sobre este documentário, eu sei que existe, mas não vi, não! Manda o link, please...

      Beijos!

      Excluir