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quarta-feira, 9 de junho de 2010

"Nem um dia se passa sem que eu pense sobre a morte de River e me pergunte porquê": John Phoenix

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Entrevista de John Phoenix à TV WEEK em 1994


Faz menos de um ano desde que o astro de cinema River Phoenix morreu de uma overdose de drogas, com apenas 23 anos. Entretanto, ele já é uma lenda. Para a sua própria geração, ele é o moderno James Dean. Desde a morte de River, seu pai John, sua ex-namorada Sue Solgot e outros próximos dele mantiveram seus sentimentos privados. Agora, determinados a que a verdade seja dita, eles falaram. Através de seus olhos, essa é a verdadeira história de River.

Insetos brilhantes e coloridos, macacos e pássaros tropicais deslizavam e emitiam sons na Floresta Tropical. Um perfume inebriante flutuava do pomar, enquanto ao longe vinha o barulho rítmico das ondas do Oceano Pacífico quebrando contra as pedras irregulares. A cena confrontava River Phoenix, que a admirava da varanda da fazenda de seu pai John, na cidade costa riquenha de Montezuma, e não poderia ser mais serena.

No entanto, o ar de tranqüilidade servia apenas para enfatizar os tumultos interiores da deslumbrante estrela de 23 anos. Ele tinha feito a longa peregrinação para seu remoto lugar escondido - sete horas de trem e ônibus da capital San Jose - numa tentativa de ganhar novamente algum senso de sanidade depois de outra esgotante tarefa na rápida pista de Hollywood.

Para escapar do turbilhão de remorsos de filmar, festejar, telefonar para amigos, fãs... das drogas pesadas. Mas para John, cujo desprezo por esse mundo superficial já tinha levado a separação da mãe de River, Heart, e a procurar uma nova vida na Costa Rica, isso não significava deixar seu filho sozinho.

Ao longo dos anos anteriores ele tinha assistido com alarme crescente seu filho – a quem ele e sua mulher criaram para rejeitar valores capitalistas e viver como um livre espírito adorador da Terra – sendo sugado lentamente pelos abutres de Tinseltown. E embora River tenha sido encorajado a tomar suas próprias decisões, John agora sentiu que devia falar firmemente.

“Eu basicamente falei a ele que o queria fora dos filmes”, diz John, um rijo homem barbudo com o desconcertante hábito de encarar por longos períodos, e então subitamente se mover com um olhar de procura zombeteiro.

“Na verdade, eu estive estimulando ele a parar um tempo. Eu tinha visto muitos garotos brilhantes se darem mal e eu percebi que ele não podia ir contra o sistema. Eu pensei que era tempo dele parar. Isso foi seis semanas antes dele morrer. River tirou um tempo entre os filmes e veio aqui com seu irmão Joaquin (também conhecido como Leaf), e suas irmãs, Rain, Liberty e Summer.”

"Eu tinha aberto em minha casa um restaurante vegetariano; as coisas estavam zumbindo. A idéia era deles passarem mais tempo aqui, ajudando na cozinha, fazendo música, escrevendo, colhendo frutas orgânicas e vivendo como costumávamos viver”.

"Eu fiquei chocado depois quando soube que River estava usando heroína. Nós sempre o ensinamos que as drogas não eram a resposta e ele não estava usando isso aqui. Ele estava limpo. Mas eu percebi que as coisas estavam erradas. Eu podia ver que Hollywood estava devorando ele, fazendo-o sangrar.”

“River falava que ele pararia futuramente, mas ele insistiu em fazer mais um ou dois filmes. Como aconteceu, isso já era muito. Pouco antes dele ir, eu sempre vou lembrar, ele me disse, 'Eu verei você depois desse filme, pai'. Bem, ele viu. Mas ele estava dentro de um caixão”.

John Phoenix nunca foi entrevistado anteriormente, em grande parte porque ele não acredita na mídia em massa, vendo isso só como outra ferramenta da obsessão materialista da sociedade de hoje. Porque ele está falando agora não é claro. Talvez seja porque nove meses atrás seu filho sofreu uma overdose de heroína e cocaína (speedball) no Viper Room, um clube noturno em Los Angeles, e ele ainda está purgando sua dor. Talvez seja porque TV WEEK o encontrou bebendo cerveja e rum num bar em Montezuma. Ou talvez porque esse hippie é muito polido para mandar estranhos embora.

Qualquer que seja a razão, nosso encontro nos permite um fascinante insight nas provações que atormentavam River em seus últimos dias e que talvez – apenas talvez – tenham sido indiretamente a causa de sua morte. O tema central é um de grande conflito.

River estava dividido entre a sede por adoração e o desejo de anonimato; entre a segurança da riqueza e a crença na simplicidade; entre a sedução da heroína e sua vida limpa, uma imagem pública de consciência ambiental. Mais crucial de tudo, entre as metas de sua mãe e as de seu pai.

Não é que os valores de John e Heart tenham mudado. Eles continuam basicamente os mesmos que eram nos anos 60 quando eles deixaram seus empregos, abandonaram tudo e começaram sua “busca espiritual”. Mas enquanto Heart acreditava ser possível para River ser uma grande estrela e continuar fiel aos seus ideais – talvez até espalhar sua mensagem – seu marido percebeu que ou você está em um lado ou do outro.

Inicialmente John concordou em fazer do jeito de Heart. Ele acompanhava seu filho nos sets de alguns filmes como A Costa do Mosquito e Stand by me, tornando-se um relutante acessório da extravagância de Hollywood. Entretanto, futuramente, pressionado pelo “hype” e seguidores, ele deixou sua mulher e sua banda de seguidores hippies na comunidade da fazenda na Flórida e foi para a Costa Rica.

River se juntaria a ele quando tudo se tornasse demasiado. Vestido em velhas roupas folgadas e eventualmente descalço, ele tocava sua guitarra e ajudava no restaurante. Nas noites, talvez ele dançasse, bebesse vinho e fumasse maconha, nada mais. Se este deveria se tornar o estilo de vida permanente de River era uma pergunta bastante debatida.

“A mãe dele é uma bela pessoa e eu ainda a amo, mas nós tivemos as nossas diferenças, vamos colocar assim” diz John. “Heart pensou que poderia cuidar de River, proteger todos os seus interesses acima do sistema. Mas nossa idéia original para ele era fazer filmes o suficiente para estarmos financeiramente seguros e depois parar. Nós fizemos dinheiro suficiente para manter todos os nossos próximos... dentro da lei, foragidos, amigos, grupos do meio ambiente, tanto faz, e eu queria que nós todos saíssemos”.

“No entanto, a pressão estava lá para continuar, fazer mais. Eles se importam apenas com dinheiro e nada mais. É maligno, lugar ruim. Íris Burton (agente de River) disse há 10 anos atrás que jovens atores eram como pedaços de carne e River era um fillet mignon. Talvez soe duro, mas ela era a única dizendo a verdade. Quando ele ficou famoso, choviam scripts. Todos queriam um pedaço dele. Ele estava constantemente sob pressão para fazer mais filmes, fazer mais dinheiro”.

“Houve uma vez – e isso nunca foi contado – em que ele bateu o carro. Ele ficou bem chateado, mas o diretor disse a ele que ele devia trabalhar no prazo. Eles mantinham ele lá até 2 da manhã.”


“River era brilhante, uma bela criança que não faria mal a ninguém. Mas ele era ingênuo. Ele queria agradar a todos. E era 'River posso te conseguir isso?', 'River prove isso'. 'Vamos ali, fazer essa coisa doida'. Não me leve a mal, ele tinha um lado louco também, mas essas pessoas eram algo mais. Isso começou a dominá-lo.”

“Existem tantos idiotas que satisfazem cada necessidade sua. Houve momentos em que as pessoas deveriam ter dito, 'Não, River. Está tarde, eu estou cansado e você também.' “Se eu estivesse em Hollywood com ele no último outubro, ele nunca teria morrido. Ele nunca teria ido naquele clube. Eu não estou dizendo que eu podia controlar sua vida – ele tinha 23 anos, era dono da sua vida – mas ele escutava o que eu tinha a dizer e respeitava.”

“Eu estou escrevendo meu próprio livro para tentar entender tudo e o livro vai dar respostas”, ele diz. “Eu tenho datas, horas, lugares e isso vai identificar a pessoa mais responsável. Na hora que eu tiver escrito, todos vão saber quem é. Ok, River era um adulto, e ele deveria ter sabido o que estava fazendo. Mas ele era um inocente no meio de alguns ratos do esgoto de Hollywood.”

Ele interrompe e, como se dirigido por alguma força interna, subitamente diz abruptamente o nome do homem que, sobre todos os outros, ele acredita ser o culpado. Por razões legais, TV WEEK não pode publicar.

Mas do homem, um famoso rockstar, John diz: “Ele tem só 23 anos, a mesma idade que tinha River quando morreu, mas ele tem muito em seus ombros. Ele está se mantendo fora do meu caminho, porque ele sabe que eu estou procurando por ele. Se você o vir, diga que eu vou estrangulá-lo... não, não publique isso... mas diga a ele, diga a ele, ele é um assassino.”

“Ele é muito rico, mas ele é um usuário de drogas pesadas e agora ele é um incentivador. Com River ele era, como, 'Use drogas, use drogas.' Se você encontrá-lo por acaso, diga a ele que ele pode ter voltado da reclusão agora, mas ele vai pagar.”

“Eu quero que ele saiba que eu acho que ele é escória. Você pode fazer isso por mim. Imprima isso e deixe-o ver. Ele se insinuou na vida do meu filho e River era muito doce para rejeitá-lo. River estava saindo das drogas e, na verdade, tentando tirar esse cara da heroína também. River o levou a uma fazenda, conversou com ele por horas investindo tempo nele. Mas o cara escapou e puxou meu filho para baixo com ele. Agora ele está vivo e River morto. Onde está a justiça nisso?”

Ele deixa a pergunta no ar e bebe outro gole de sua cerveja.

Apontar o dedo para um desgraçado viciado em heroína é compreensível o suficiente. No entanto, certamente, a maneira que seu filho faleceu deve ter levado ele e Heart a questionar a sabedoria da educação não convencional de River.

“Com certeza”, ele diz, “Nós todos somos culpados. Todos que conheciam River. Mas você não acha que eu perguntei a mim mesmo tudo que você está me perguntando agora, dúzias de vezes? Nem um dia se passa sem que eu pense sobre a morte de River e me pergunte por quê.”

Ele bebe seu último gole e entra na caminhonete dirigida por seu amigo costa-riquenho e caseiro, Jason. De volta ao restaurante vegetariano onde nenhuma refeição foi servida desde a fatídica noite de 31 de outubro de 1993. De volta às iguanas e aos belos mosquitos...


Fonte: TV WEEK

"Obrigada Querido, Filho Adorado": por Heart Phoenix


Carta aberta da mãe de River, publicada no Los Angeles Times após sua morte


"Obrigada Querido, Filho Adorado"

by Heart Phoenix


"Acho que as pessoas estão querendo saber se River cumpriu sua missão ou se ele foi tirado do mundo prematuramente.

River foi o meu primeiro filho. Ele me apresentou à maternidade e foi a mais forte influência em minha vida. Eu me sinto abençoada por ter sido a mulher que o carregou profundamente dentro do seu corpo enquanto ele crescia a partir de uma pequena semente. Eu dei à luz em casa, e o amamentei até transformá-lo num garoto gordinho de dois anos e o tratei com muito amor e admiração até sua morte no dia 31 de outubro.

Foi incrível ver River crescer. Desde o princípio, ele era uma alma cheia de paixão e um sentimento de servir ao próximo. Muito jovem, ele assumiu a responsabilidade de compartilhar os dons maravilhosos que foram dados a ele. Ele se esforçou para aprender sozinho a tocar violão aos quatro anos, cantava nas ruas da Venezuela à Califórnia, e escrevia músicas com letras que procuravam abrir os corações de uma maneira diferente.

Muitos de vocês puderam entrar em contato com a sua gentileza, doçura, beleza e vulnerabilidade nas telas. Ele sempre escolheu personagens que tocavam o espírito do público, despertando sentimentos há muito esquecidos. Com a morte do River, pessoas de todo o mundo sentiram sua perda e, mais uma vez, sentimentos profundos afloraram.

O relatório do legista afirmou que as drogas foram a causa de sua morte. Seus amigos, colegas de trabalho e o restante da nossa família sabe que River não era um usuário regular da droga. Ele vivia com a gente, em nossa casa, na Flórida, e quase nunca participava da vida noturna de Los Angeles. Ele tinha acabado de chegar em LA, direto da beleza intocada e da tranquilidade de Utah, onde esteve filmando durante seis semanas. Sentimos que a empolgação e a energia daquela festa de Halloween numa boate estavam muito além de suas experiências habituais e de seu controle. Quantas outras belas e jovens almas, que permanecem anônimas para nós, não morreram por usar a droga como uma forma de diversão? Eu rezo, sinceramente, para que a morte de River desta forma sirva para chamar a atenção do mundo sobre a forma como os espíritos dessa geração estão sendo dolorosamente destruídos.

Eles estão crescendo com o ar poluído, terras e comida intoxicadas e uma água imbebível. Estamos destruindo nossas florestas, a camada de ozônio está sendo destroçada e a AIDS e outras doenças são grandes epidemias. O mundo é um lugar muito confuso para a maioria dos jovens e nós precisamos resolver isso. O abuso de drogas é apenas um sintoma de um mundo insensível, materialista, orientado para a busca do sucesso a qualquer preço, no qual os sentimentos e a criatividade dos jovens não recebem a importância merecida. Drogas, incluindo álcool, são utilizados para amenizar a dor de nos sentirmos separados de nós mesmos, uns dos outros e do amor. Não podemos simplesmente dizer "Apenas diga não às drogas" - isso é ridículo - precisamos oferecer às nossas crianças algo para o que possam dizer "sim".

Tenho tentado fazer algum sentido desse caos em relação à situação do mundo durante muitos anos, e com a morte de River, me sinto mais esclarecida do que nunca. Eu sinto que a resposta para a nossa natureza destrutiva, que se manifesta de muitas formas, e na nossa inabilidade para amar e cuidar uns dos outros, baseia-se no nosso distanciamneto de cada parte natural do que somos. O Universo e a Terra são magníficos sistemas de oceanos, rios afluentes e córregos; de elétrons, átomos, microrganismos, plantas e animais; de plâncton, musgo e árvores. E nós, humanos, acreditamos que podemos ficar à parte deste sistema de vida e dizer que nós somos os mestres.Agimos como se tudo isso tivesse sido posto aqui para que pudéssemos usar, abusar e lucrar. Nos separamos da essência da vida, a fim de nos elevarmos como a perfeita expressão divina na Terra.

River causou um grande impacto durante sua vida na Terra. Ele encontrou sua voz e seu lugar. E mesmo River, que tinha todo o mundo pronto para ouvi-lo, sentia profunda frustração por não ser escutado. O que precisa acontecer ainda? Chernobyl não foi suficiente. O naufrágio do petroleiro Exxon Valdez não foi suficiente. Uma guerra sangrenta pelo petróleo não foi suficiente. Se a morte de River abrir o nosso coração global, então eu digo, obrigada querido, filho adorado, por mais um presente para todos nós."


Fonte: Los Angeles Times